‘Raízes Africanas’
O juízo de valores preconcebido, ou preconceito, encontrado em todas as partes do mundo, está sempre acompanhado por atitudes discriminatórias contra o indivíduo ou grupo, como a intolerância racial, religiosa, entre tantas outras formas repulsivas de se externar o inaceitável.
Compreender a psique humana é tarefa árdua, indiscutivelmente.
No
entanto, me arrisco a dizer que o preconceito nasce da ignorância, na
acepção do termo, partilhando do entendimento do escritor e filósofo
inglês William Hazlitt, que escreveu sabiamente que “O preconceito é
filho da ignorância”.
A forma de eclosão do preconceito é a criação de uma universalização superficial e burra, também conhecida como estereótipo.
E
aí é que a coisa começa a mudar de figura, se aproximar mais da nossa
realidade, da realidade do candomblé, e também da umbanda, ainda que
sejam religiões completamente diferentes, porém que experimentam o mesmo
preconceito.
O
estereótipo do “macumbeiro”, “preto” e “pobre”, está sedimentado na
concepção popular, justamente pela falta de conhecimento. Sem falar que o
candomblé é considerado “Uma religião para os excluídos”, como lembrou
nossa irmã Manuela no artigo de mesmo nome publicado recentemente neste
espaço.
Curiosamente, presenciei há alguns dias uma conversa entre um zelador de santo branco de olhos azuis e uma não adepta. Chamou-me
a atenção o fato da distinta senhora visivelmente espantar-se ao ver o
sacerdote, deixando escapar puerilmente a seguinte afirmação: “Nossa,
pensei que o senhor fosse negro…”.
Por um momento ouviu-se um silêncio sepulcral.
Tomei
meu rumo inquieto, pensando no preconceito racial deslavado que impera
cotidianamente, e então me lembrei que o Brasil, vergonhosamente, foi o
último país da América Latina a abolir a escravidão.
E
que fique esclarecido que a escravidão fora abolida tão somente no frio
papel, e do contrário, guardadas as devidas proporções, ainda não me
convenci. Não é exagerado lembrar que em muitas oportunidades a grande
mídia veicula matérias denunciando o trabalho em carvoarias, pedreiras e
plantações.
O
mais intrigante é ser remetido às origens do povo brasileiro,
particularmente. O brasileiro é o mestiço por excelência, como defendeu
efusivamente o sociólogo, antropólogo e escritor brasileiro Gilberto
Freyre.
Quem
somos nós senão o resultado da encantadora e deslumbrante miscigenação,
criadora dos nossos traços culturais mais marcantes, das nossas raízes.
Digo
com tranqüilidade por ser marrano, portanto sabedor da minha origem
judaico-portuguesa, o que esclarece aos mais desatentos o caráter não
ufanista das minhas colocações.
Os
indígenas, também pejorativamente denominados bugres pelos visitantes
europeus, são parte integrante da nossa formação étnica, a formação do
povo brasileiro, como bem elucidou o grande antropólogo, escritor,
político, e imortal brasileiro Darcy Ribeiro.
Logo
após a organização dos colonizadores em solo pátrio, aproximadamente em
1549, chegou ao Brasil à primeira leva de negros africanos trazidos
como escravos. Encontramos divergências nas datas de chegada, bem como
estudiosos que defendem a estada de negros africanos no Brasil antes
mesmo do início do tráfico negreiro.
Sabe-se
que ao longo de 300 anos o Brasil recebeu uma população de
aproximadamente 3.500.000 de escravos, vindos de diversas regiões da
costa africana, como os Angolas, os Bantos, os Nagôs (Yorubás), dentre
outros.
O
povo africano contribui significativamente para a construção das
riquezas do País, além de ser parte fundamental da base de formação da
etnia brasileira, juntamente com os citados indígenas.
A
vastíssima herança cultural é percebida na religião, na língua, na
gastronomia, na música, e até mesmo na contagiante alegria, e me
corrijam se eu estiver equivocado.
Como
então, sem qualquer justificativa plausível, o brasileiro, em especial,
pode renegar preconceituosamente o candomblé e as outras manifestações
do negro africano senão por cristalina ignorância?
Mas
não há problema, somos uma nação jovem que aprenderá a importância do
respeito aos antepassados e as raízes, pois renegar o negro e sua
contribuição histórica é, sem dúvida, renegar a si próprio.
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