Compreendendo a Deusa Universal

deusa
Compreender e aceitar, em si, a ideia de uma força cósmica universal como feminina não é ignorar ou simplesmente excluir a magnitude masculina existente no Todo. Reafirmar o Cosmo como Mãe Divina, ou simplesmente como Deusa, é se reencontrar com as práticas e pensamentos de nossos antigos ancestrais paleolíticos que começaram a atribuir aspectos femininos na terra e, futuramente, em tudo que existia. A partir daí começamos a respeitar e reconhecer a Terra como Mãe Natureza.
De fato, é difícil perceber a imensidão divina da Grande Mãe, mas não é impossivel. O que para alguns pode ser um grande ”absurdo” espiritual, poderia ser pra outros um conhecimento rico e valioso para o espírito que procura se envolver e se reconectar com a natureza em geral. Esta natureza que falamos não está apenas nas árvores, plantas, flores, mares, terras e, lagos, rios ou o próprio ar, esta natureza vai muito além disso: Vulcões, furacões, terremotos, chuvas, céu, estrelas, luas, atmosferas, planetas, nebulosas e assim por diante.
O que nossos antigos viam como uma terra-mãe, se enriqueceu com todos os atributos femininos conhecidos da época. Sendo assim, a mulher começou a ser reflexo daquilo que poderia ser conhecido, hoje, como Deusa. Essa visão cósmica à respeito da mulher não ficou fixa em apenas uma área dos antigos povos, mas se espalhou por todo o mundo em diversas civilizações, povos e culturas.
A Arte da Mulher:
O que podemos ver em pinturas e esculturas paleolíticas (e também anteriores a este período) são todas as manifestações de importâncias femininas da época, como podemos ver na antiga figura da Vênus de Willendorf (Na Áustria) e da Vênus de Laussel (Na França). Intrigante perceber que estas peças datam entre 24 mil à 20 mil anos atrás e estão cerca de 1.300 KM de distância, obviamente de suas descobertas. É claro que existem outras pinturas, as famosas pinturas nas cavernas, que reverenciam o sagrado feminino como fonte de vida e criação de todos os seres.
Vale também informar, antes da apresentação desta visão do Divino como Deusa, detalhes importantes sobre a vida do povo paleolítico, ou melhor dizendo… Morte. Alguns achados arqueológicos (em um abrigo de pedra conhecido como Cro-Magnon, em Les Eyzies, na França)mostram fósseis humanos com um elemento natural muito semelhante a vagina, ou o ”portal que dá à vida”: Uma concha. Outro aspecto interessante de se notar é que os enterros no Paleolítico formaram-se em práticas ritualísticas, onde o morto era enterrado em posição fetal e pintado com ocre vermelho que simbolizaria o líquido da vida, o sangue feminino, que representaria a ressurreição do falecido em outro corpo.
Começamos a notar que esses atributos femininos foram levados à diante para diversos aspectos naturais, na vida e na natureza como um todo, passando pelo tempo e pelos povos que foram evoluindo durante o passar dos anos e dando à Ela nomes e formas diferentes.
Reafirmando Deuses:
Me perguntam, à partir de minha espiritualidade e crença na Grande Deusa, como vejo os deuses e deusas… Usando minhas próprias experiências de estudos, eu diria que os deuses nada mais são do que manifestações personificadas da Natureza. E não, não posso dizer que todos os deuses são um só deus e todas as deusas são uma só deusa, pois cada divindade possui sua própria manifestação e consciência. Mas não posso negar que, ao meu ver, todas as deusas e deuses fazem parte da mesma fonte de criação que, eu, chamo de Deusa, pois reconheço que as primeiras fontes de culto e devoção ao divino foram dos aspectos femininos.
Mas então, os deuses ”foram criados”? Não, absolutamente NÃO! Os deuses sempre existiram, mas a nossa percepção de enxergá-los demorou muito para evoluir. Acontece que a maior forma de demonstrar o reconhecimento dos deuses ou do divino na natureza é com a comparação do nosso ser com aquilo que está fora: Por que é que os antigos assemelhavam o Oceano com a mulher ou com a terra? É importante refletir que tudo aquilo que existe na natureza é semelhante a nós, humanos, em diversos aspectos e essa lógica foi representada no Paleolítico com desenhos demonstrando a igualdade dos seres surgindo da mesma Fonte, feminina.
A Semelhança Divina:
Ao olhar para terra, para árvore ou para as cavernas podemos refletir na semelhança de tudo isso conosco: Procure olhar para uma árvore e olhar para uma mulher, ou pra si se for uma, e repare nas semelhanças que ambas possuem, procure reparar na semelhança das curvas da árvore e nas curvas femininas, procure reparar nos atributos doadores de fruto, vida, que a árvore tem e que a mulher tem. O mesmo se aplica nas cavernas e na terra, que possuem uma semelhança com o útero feminino que são escuros, possuem o mistério da criação e, no caso da caverna, possuem a abertura para o mundo exterior e entrada para o mundo interior, já que em muitas vezes a caverna leva aos caminhos misteriosos que existem na própria terra.
A Água:
Ainda com toda essa comparação do sagrado-natural e o sagrado-humano, utilizo o Oceano/Mar que para muitos cientistas e outros estudiosos os veem como fonte da vida biológica. O Oceano e o Mar trazem atributos formidáveis à respeito da comparação com a mulher, que assim como o oceno, possui a imensidão dos mistérios escuros em seu íntimo-interior e com o liquido que representa a vida. Sabe-se que uma das primeiras demonstrações da vida que a mulher pode gerar em seu útero é quando o sangue menstrual começa a ”se apresentar” para ela, sem contar o fato de que ao dar a luz, o primeiro sinal que a mulher recebe da vida que vem à caminho é o líquido amniótico que desce quando a bolsa estoura. O leite materno é outro líquido que consideramos sagrados e está ligado à vida e diretamente com a mulher. Notável, também, que a água compõe 85 % do sangue, 75% do cérebro, 70% dos músculos e até 22% dos ossos. É imensamente importante lembrar que este elemento é um dos mais importantes em nossas vidas.
Usando as palavras de Mirella Faur, sacerdotisa da Deusa, diria que ”A Grande Deusa é a quintessência fluida formada das águas, as celestes e as subterrâneas (onde pertencem os córregos, riachos, rios, cachoeiras, fontes, lagos, mares), em cujo ventre a vida se formou como se fosse um peixe”. Sabe-se que ao longo dos tempos as personificações do mar começaram a ter nomes, obviamente ligado ao feminino, como Tiamat, a Serpente das Profundesas (Sem esquecer do Mar Priomordial da mitologia sumério-babilônica, Nammu), Atargatis, a deusa-peixe da antiga síria e logo depois começamos a conhecer as deusas, que chamamos de venusianas, ligadas à este mesmo elemento como ísis, Afrodite, Ishtar e Yemanjá.  Sendo assim, é inegável ignorar tais divindades que representam o mar como fonte da vida, do amor e da maternidade, já que muitas das divindades aqui citadas possuem essas características anteriores ao patriarcado.
A Divina Força Vital:
Em toda imensidão universal que pertence à Deusa, uma de Suas características menos reconhecidas, por muitos, é a face, ou aspécto, da Força Vital. Essa força cósmica, profundamente desconhecida nos faz imaginar, ou não, a imensidão que Ela representa. Segundo o Tantra, uma das tradições indianas, existe uma deusa (devi) primordial que está à cima de todos os outros devas, é, literalmente, a poderosa Shakti/Sakti e também chamada Maha Devi (Grande Deusa). Seu nome significa ”O Poder” e, pela tradição, acredita-se que Ela é a força vital de todas as coisas, força que está à cima de todas as outras forças, força iniciadora que move tudo, incluindo os Devas. É também interessante citar que, uma das maiores influências para meu culto à Grande Deusa, com o Todo, é o próprio Tantra que demonstra que essa incrível deusa, Shakti, possúi diversas outras formas e manifestações, como Kali, Durga, Lakshmi, Radha e Parvati.
A Deusa e o Masculino:
É normal não aceitar ou não compreender muito bem esse culto de um homem à Grande Deusa, já que esse mesmo culto vem sido reconstruído, reafirmado e restaurado por mulheres. Na religião Wicca é a Tradição Diânica que fica responsável por essa visão, por esse direcionamento do culto à Deusa ou à diversas deusas e só. O que muitas pessoas, homens na maioria das vezes, não conseguem, não querem, entender é que o culto da Deusa, do sagrado feminino e das deusas em geral, vem sido deturpado, tomado, apagado e destruído por cultos patriarcais e/ou pelo culto de uma única figura patriarca e totalmente machista que temos, infelizmente, representado hoje no Brasil, considerado o maior país cristão do mundo.
Vemos em muitas culturas a imagem de uma deusa sendo apagada ou deixada de lado, pois a representação de um deus masculino tornou-se maior, graças a sua ”legitimidade” da força bruta e opressora contra os mais fracos, incluíndo mulheres. Nessas tradições e culturas anteriores ao patriarcado, o matriarcado, era a mulher que tinha o papel principal, era a mulher responsável por leis, religiosidade e governo. E não, não era algo ruim. Pelo que se tem dados, os povos matriarcais eram povos passivos, igualitários (já que, mesmo sendo matriarcal, não excluía a imagem do homem como sagrado e divino) e teoricamente pacífico. Religiosamente falando, haviam cultos ligados diretamente à mulher, o sagrado feminino, e ao homem. Haviam tradições específicas de cultos para deuses e deusas, alguns exclusivos para homens e outros para mulheres, mas não era inexistente o culto misto, onde mulheres cultuavam deuses e homens deusas.
A Chama Divina e Interior:
O ser humano, assim como toda a natureza, possui a ”centelha divina”, a pequena parte do grande Cosmo, ou da Grande Deusa. Somos o reflexo daquilo que está à cima e além de nós, dentro de nosso ser possuímos o microcosmo. Em diversas tradições e mitologias, tomamos o sopro divino, o que desperta o ser e sendo assim, tomamos uma pequena parte da criadora ou criador. Nos tornamos semelhantes, nos tornamos divinos.
Temos dentro de nós o masculino e o feminino, somos Yin e Yang, luz e sombras, amor e ódio, noite e dia. É claro que existe essa diferença nas profundezas da consciência do homem e da mulher. Rae Beth utiliza muito bem essas interpretações, dizendo que o homem pode, SIM, sentir em sua consciência o toque da Grande Deusa, mas não tão profundamente quanto a mulher. E isso é bem óbvio, já que podemos ver que o Sagrado Feminino se manifesta de forma ampla em toda mulher, assim como o Masculino em todo homem.
Do Masculino à Deusa:
Um homem cultuar à Deusa não é errado, um homem cultuar à Deusa é se reencontrar, é se aventurar no feminino que faz parte de todos nós, pois todos nós, mesmo possuindo a essência do pai, temos todo o cuidado reprodutivo da mãe, e é no útero da mãe que a vida toma forma e sentido, nós absorvemos parte dela antes e depois de nosso nascimento. Um homem que cultua à Deusa de todo seu coração, procura realinhar e equilibrar o espírito e a mente, se conectando com a força criadora transcendente da Mãe Cósmica e com a manifestação física do Pai Celeste.
Por último, gostaria de aproveitar as citações de Rae Beth e dizer que a Deusa possui diversas formas, surpreendentes e majestosas formas universais. A Deusa é tanto o Sol quanto a Lua, o mar e terra, o medo e a coragem, a vida e a morte, a luz e a sombra, o homem e a mulher… Mulher, Divina Mulher que está à cima de todas as mulheres, que pode possuir a forma da mulher, mas ao mesmo tempo Ela se encontra à mais que isso, Ela é mais que uma forma física, Ela é a Mulher que a nossa consciência nos permite conhecer. Pois os mistérios Dela pertencem à Ela, que é a Vida antes da vida, Ela é Aquilo que foi, que é e que SEMPRE SERÁ!

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